sábado, 22 de abril de 2023

Os “números” por trás dos atentados

“Este é o nosso mundo

O que é demais nunca é o bastante

E a primeira vez é sempre a última chance

Ninguém vê onde chegamos

Os assassinos estão livres, nós não estamos

Vamos sair mas não temos mais dinheiro

Os meus amigos todos estão procurando emprego

Voltamos a viver como há dez anos atrás

E a cada hora que passa envelhecemos dez semanas” (trecho da música Teatro dos Vampiros, Legião Urbana)

            O pânico foi instalado após uma série de atentados nas escolas, motivos para os pais perderem o sono e os alunos a travarem de vez a vontade de ir para a escola. Nos EUA a situação sempre foi pior e os atentados não tem lugar específico, mas as escolas são alvos de tempos em tempos. A reflexão na pandemia foi: o que somos? Do que adianta muitas coisas diante desta doença que nada se pode fazer? Passando alguns meses de tranquilidade estatística, tais reflexões sumiram e o mundo volta a ser mundo, com direito a guerra na Ucrânia mesmo na pandemia.

            A indagação mediante as mortes do dia a dia sem motivos agora é: o que está acontecendo com a população? Os ataques as escolas não são casos isolados da violência, quem acompanha os meios de comunicação jornalística sabem que o feminicídio virou uma pandemia do mal, o abuso de drogas está transformando as pessoas em zumbis sociais, a violência doméstica estourou nos tempos de pandemia e não regrediu mais. Sim, a sociedade está doente!

            Minha opinião sobre esse assunto é um compilado do que já ouvi de pessoas em atendimento nos meus 18 anos de formado em psicologia clinica e hospitalar ininterruptos. Os números crescentes de mortes nos atentados as escolas tem como peça chave, os números. O ser humano em grande parte no mundo tem tratado as pessoas como meros números. Muitas empresas exigem números para a entrada e permanência, mas há os que dizem que o mercado de trabalho é uma selva, sim até pode ser, mas até na selva o animal expulso do bando, com fome ou não aceito, desenvolve mais agressividade, tornando predador até de espécies fora de sua cadeia alimentar. Empresas que capacitam para que hajam eficácias na produção de forma humana correm por fora desta selva.

            No sistema de ensino, muitas escolas correm atrás do tempo com os seus professores para ficar com os conteúdos em dias e precisam fazer com que a sala renda nas avaliações para que tenham bônus salariais e outros benefícios. Fazendo com que os alunos que não acompanham ou tem um problema de aprendizagem não diagnosticado devido a precariedade de profissionais especializados nos assuntos (mais números), uma vez que trabalhos voluntários e de ONGS na área tem suas dificuldades, porque não sobrevive sem recursos (mais números). Augusto Cury a muito tempo atrás enfatizou que deveríamos estar mais atentos a educar as emoções, o que resultou em um material didático nas escolas particulares denominado “escola da inteligência” (menos números, ou seja, só para um público que aderiram). Também é motivo de exclusão os depressivos, os que possuem alguma doença mental, os que apresentam dificuldades comportamentais no momento, tidos como pessoas que não somam, destinados então ao isolamento.

            O seu poder de compra e o relacionamento com Bancos, financeiras e até pessoas, tem como exigência máxima os seus números (mais números), sejam patrimoniais, Score ou cifras salariais de maior evidência. Fazendo com que famílias só autorizem casamento dos filhos se a parte escolhida tiver números positivos. Isso é um grande passo ao fracasso pessoal de muitos e uma das causas de tentativa de suicídio feminino e agressividade masculina (dificuldade no relacionamento afetivo).

            Usando o termo selva, muitas pessoas entre elas os adolescentes e jovens vivem exclusão social devido a não preencherem os pré-requisitos de uma sociedade perfeccionista, de uma religiosidade acusatória e moralista, de uma política de embates teóricos que giram em torno de ataque e defesa com a oposição. Enquanto o valor das pessoas estiver nos números, os números de mortes só vão aumentar. E todos estão no mesmo barco, pois a pessoa que se tornou violenta torna-se um risco para todo aquele que cruzar o seu caminho, nele pode estar um adepto dos números como base de valores.

            Sou um admirador de Jesus Cristo e daqueles que vivem uma vida tentando repetir os seus passos como Madre Teresa de Calcutá. Ele nos apresentou o número 3 que ressoa em sua trindade sobre a ótica do maior mandamento que é “amar a Deus, o próximo como a ti mesmo”. Essa matemática coloca todos na mesma chave de divisão, mostrando que a conta não vai bater se o contrário acontecer. Ele também orientou que não devemos servir a dois senhores: Deus e Mamon. Mamon é o dinheiro elevado ao patamar de divindade, ou seja, o sistema de exclusão por números. Pois se você precisar de números para amar, para confiar, para estender as mãos, você está servindo o sistema apenas. Por isso muitas igrejas e templos não somam com as causas sociais, porque até dentro delas o que vale são os números (quanto dizima, quanto ora, quanto trabalha para a igreja).

            Iris Vieira é psicólogo Clínico, Hospitalar , Palestrante, coordenador dos comitês de prevenção do suicídio e de violências em Paraguaçu Paulista-SP

            Contato: @iris_palestrante / irispsicologo@gmail.com